[K 2, 1]

II o heroi

“É estranho, além do mais, constatar que, ao observar este movimento intelectual em seu conjunto, Scribe tenha sido o único a tratar do presente de forma direta e profunda. Todos os outros ocupam-se mais com o passado do que com os poderes e interesses que põem em movimento seu próprio tempo… Foi igualmente do passado, da história da filosofia, que a doutrina eclética tirou suas forças; e foi finalmente a história da literatura, cujos tesouros a crítica descobriu com Villemain, sem aprofundar-se na vida literária de sua própria época.” Julius Meyer, Geschichte der modernen französischen Malerei, Leipzig, 1867, pp. 415-416.

[K 2, 3]

I recepção-III- salvação

Diz-se que o método dialético consiste em levar em conta, a cada momento, a respectiva situação histórica concreta de seu objeto. Mas isto não basta. Pois, para esse método, igualmente importante levar em conta a situação concreta e histórica do interesse por seu objeto. Esta situação sempre se funda no fato de o próprio interesse já se encontrar pré-formado naquele objeto e, sobretudo, no fato de ele concretizar o objeto em si, sentindo-o elevado de seu ser anterior para a concretude superior do ser agora (do ser desperto!). A questão de como este ser agora (que é algo diverso do ser agora do “tempo do agora”, já que é um ser agora descontinuo, intermitente) já significa em si uma concretude superior, entretanto, não pode ser apreendida pelo método dialético no âmbito da ideologia do progresso, mas apenas numa visão da história que ultrapasse tal ideologia em todos os aspectos. Aí deveria se falar de uma crescente condensação (integração) da realidade, na qual tudo o que é passado (em seu tempo) pode adquirir um grau mais alto de atualidade do que no próprio momento de sua existência. O passado adquire o caráter de uma atualidade superior graças à imagem como a qual e através da qual é compreendido. Esta perscrutação dialética e a presentificação das circunstâncias do passado são a prova da verdade da ação presente. Ou seja: ela acende o pavio do material explosivo que se situa no ocorrido (cuja figura autêntica é a moda). Abordar desta maneira o ocorrido significa estudá-lo não como se fez até agora, de maneira histórica, mas de maneira política, com categorias políticas. ■ Moda

[K 2, 5]

Sobre a doutrina da superestrutura ideológica. A primeira vista, parece que Marx pretendia somente estabelecer uma relação causal entre superestrutura e infra-estrutura. Mas a observação de que as ideologias da superestrutura refletem as condições de maneira falsa e deformada já vai além. A questão é, de fato, a seguinte: se a infra-estrutura determina de certa forma a superestrutura no material do pensamento e da experiência, mas se esta determinação não se reduz a um simples reflexo, como ela deve então ser caracterizada, independentemente da questão da causa de seu surgimento? Como sua expressão. A superestrutura é a expressão da infra-estrutura. As condições econômicas, sob as quais a sociedade existe, encontram na superestrutura a sua expressão — exatamente como o estômago estufado de um homem que dorme, embora possa “condicioná-lo” do ponto de vista causal, encontra no conteúdo do sonho não o seu reflexo, mas a sua expressão. O coletivo expressa primeiramente suas condições de vida. Estas encontram no sonho a sua expressão e no despertar a sua interpretação.

[K 2, 6]

O Jugendstil — uma primeira tentativa de confrontação com o ar livre. Ele encontra uma primeira expressão característica, por exemplo, nos desenhos da revista Simplizissimus, que mostram claramente como era preciso recorrer à sátira para se conseguir respirar. Por outro lado, o Jugendstil pôde se desenvolver naquela luminosidade e naquele isolamento artificiais nos quais o reclame apresenta seus objetos. Este nascimento do “ar livre” a partir do espírito do intérieur é a expressão sensível da situação do Jugendstil do ponto de vista da filosofia da história: ele significa sonhar que despertamos. ■ Reclame

[K 2a, 1]

Assim como a técnica mostra a natureza em uma perspectiva sempre nova, assim também, no que toca ao homem, ela mobiliza de forma sempre variada seus mais primitivos afetos, angústias e imagens de desejo [Sehnsuchtsbilder]. Neste trabalho, quero conquistar para a história primeva uma parte do século XIX. A face atraente e ameaçadora da história primeva aparece claramente para nós nos primórdios da técnica, no estilo de morar do século XIX; naquilo que está temporalmente mais próximo de nós, essa face ainda não se revelou. Ela aparece mais intensamente na técnica — em razão da causa natural desta — do que em outros domínios. É por isso que fotografias antigas — diferentemente do que acontece com gravuras antigas — possuem algo de espectral.

[K 2a, 2]

Sobre o quadro de Wiertz, Pensamentos e visões de um decapitado, e sua explicação. A primeira coisa que chama a atenção nesta experiência magnetopática é o salto magnífico que a consciência dá na morte. “Estranho! Aqui debaixo do cadafalso está a cabeça no chão, pensando que ainda está em cima, acredita que ainda faz parte do corpo, ainda está esperando o golpe que deve separá-la do tronco.” A. J. Wiertz, Œuvres Littéraires, Paris, 1870, p. 492. Trata-se, em Wiertz, da mesma inspiração que permitiu a Bierce criar a grandiosa narrativa do rebelde que é enforcado. No instante de sua morte, este rebelde vive a fuga que o liberta de seus carrascos.

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[K 2a, 3]

Cada corrente de moda ou de visão do mundo tem seu declive determinado por aquilo que caiu no esquecimento. O declive é tão forte que normalmente só o grupo pode se entregar a ele; o indivíduo — o precursor — corre o risco de sucumbir sob a violência da correnteza, como ocorreu com Proust. Em outras palavras: o que Proust, enquanto indivíduo, viveu em termos de fenômeno da rememoração, nós somos obrigados a experimentar (em relação ao século XIX) como “corrente”, “moda”, “tendência” — como uma espécie de castigo pela indolência que nos impediu de assumirmos esta rememoração.

[K 2a, 5]

“Muito interessante…, observar como a influência do fascismo no domínio da ciência teve que modificar justamente aqueles elementos em Freud que provinham ainda do período iluminista e materialista da burguesia… Em Jung, … o inconsciente não é mais individual — não é, portanto, um estado adquirido no homem … isolado —, e sim um tesouro da humanidade primitiva, que volta a ser atual; tampouco seria um recalque, mas um bem-sucedido retorno.” Ernst Bloch, Erbschaft dieser Zeit, Zurique, 1935, p. 254.

[K 2a, 6]

Índice histórico da infância segundo Marx. Em sua dedução do caráter normativo da arte grega (como arte nascida da infância da espécie humana), Marx diz: “Cada época não vê reviver, na natureza da criança, seu próprio caráter em sua forma verdadeira e natural?” Cit. em Max Raphael, Proudhon, Marx, Picasso, Paris, 1933, p. 175.