[B 1, 2]

Semelhança das passagens com os galpões cobertos onde se aprendia a pedalar. Nesses locais, a mulher assumia sua aparência mais sedutora: a de ciclista. Assim ela aparece nos cartazes da época. Chéret, o pintor dessa beleza feminina. A roupa da ciclista, como protótipo precoce e inconsciente da roupa esportiva, corresponde aos protótipos das formas oníricas, tal qual elas, um pouco antes ou depois, apareceram para as fábricas ou para o automóvel. Assim como as primeiras construções de fábricas apegavam-se à forma tradicional das moradias e as primeiras carrocerias de automóveis imitavam as carroças, também a expressão esportiva na roupa da ciclista luta ainda com a tradicional imagem ideal da elegância e o fruto desta luta é o toque obstinado, sádico, que tornou estes anos tão incomparavelmente provocantes para o mundo masculino. ■ Moradas de sonho

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[B 1, 4]

III novidade

Aqui a moda inaugurou o entreposto dialético entre a mulher e a mercadoria — entre o desejo e o cadáver. Seu espigado e atrevido caixeiro, a morte, mede o século em braças e, por economia, ele mesmo faz o papel de manequim e gerencia pessoalmente a liquidação que, em francês, se chama révolution. Pois a moda nunca foi outra coisa senão a paródia do cadáver colorido, provocação da morte pela mulher, amargo diálogo sussurrado com a putrefação entre gargalhadas estridentes e falsas. Isso é a moda. Por isso ela muda tão rapidamente; faz cócegas na morte e já é outra, uma nova, quando a morte a procura com os olhos para bater nela. Durante um século, a moda nada ficou devendo à morte. Agora, finalmente, ela está prestes a abandonar a arena. A morte, porém, doa a armadura das prostitutas como troféu à margem de um novo Letes que rola pelas passagens como um rio de asfalto. ■ RevoluçãoAmor

[D 1, 1]

Criança com sua mãe no panorama. O panorama representa a batalha de Sedan. A criança acha tudo muito bonito: “Pena que o céu esteja encoberto.” — ‘Assim fica o tempo na guerra”, retruca a mãe. ■ Diorama ■
Portanto, os panoramas, no fundo, estão comprometidos com este mundo nebuloso; a luminosidade de suas imagens parece transpassá-los como cortinas de chuva.

[D 1a, 1]

Sob forma de poeira, a chuva consegue vingar-se das passagens. — Sob Luís Filipe, a poeira se depositava até mesmo sobre as revoluções. Quando o jovem Duque de Orléans “desposou a princesa de Mecklenburg, celebrou-se uma grande festa naquele famoso salão de baile, em que se manifestaram os primeiros sintomas da revolução [de 1830]. Quando vieram arrumar o salão para a festa dos jovens nubentes, encontraram-no como a revolução o deixara. Notavam-se ainda no chão os vestígios do banquete militar; viam-se tocos de vela, copos quebrados, rolhas de champanhe; viam-se as insígnias pisoteadas dos gardes du corps e as fitas de gala dos oficiais do regimento de Flandres.” Karl Gutzkow, Briefe aus Paris, Leipzig, 1842, vol. II, p. 87. Uma cena histórica torna-se componente de um panóptico. ■ DioramaPoeira e perspectiva sufocada

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[D 1a, 3]

III jugendstil

A pelúcia como depósito de poeira. Mistério da poeira que brinca ao sol. A poeira e a “sala de visitas”. “Logo após 1840, surgem os móveis franceses totalmente estofados, e com eles o estilo de tapeçarias atinge seu domínio absoluto.” Max von Boehn, Die Mode im XIX Jahrhundert, vol. II, Munique, 1907, p. 131. Outras formas de levantar a poeira: a cauda. “Recentemente retornou também a verdadeira cauda; agora, porém, é erguida e segurada, durante o andar, com o auxílio de um gancho e um cordão, para evitar a inconveniência de varrer a rua.” Friedrich Theodor Vischer, Mode und Zynismus, Stuttgart, 1879, P. 12. ■ Poeira e perspectiva sufocada

[D 2, 2]

II tédio

“As construções da nova Paris são derivadas de todos os estilos; o conjunto não deixa de ter uma certa unidade, porque todos esses estilos são do gênero tedioso, e do mais tedioso dos tediosos, que é o enfático e o alinhado. Alinhados! Parados! Parece que o Anfião desta cidade é um caporal … / Ele mobiliza uma quantidade de coisas faustuosas, pomposas, colossais: são entediantes; ele mobiliza também uma quantidade de coisas muito feias: estas são igualmente entediantes. / Estas grandes ruas, estes grandes cais, estes grandes edifícios, estes grandes esgotos, sua fisionomia mal copiada ou mal sonhada guarda um não sei quê que cheira a fortuna repentina e irregular. Exalam o tédio.” Veuillot, Les Odeurs de Paris, Paris, 1914, p. 9. ■ Haussmann

[D 2, 3]

II tédio

Pelletan descreve a visita a um rei da Bolsa de Valores, um multimilionário: “Quando entrei no pátio do hotel, um grupo de palafreneiros vestindo coletes vermelhos ocupava-se em escovar meia dúzia de cavalos ingleses. Subi por uma escadaria de mármore, no alto da qual encontrava-se uma enorme luminária dourada, e encontrei no vestíbulo um camareiro de gravata branca e canelas volumosas que me conduziu a uma grande galeria envidraçada. cujas paredes estavam inteiramente decoradas com camélias e plantas de estufa. Uma espécie de tédio secreto pairava no ar; ao primeiro passo, respirava-se um aroma que lembrava o ópio. Passava-se por uma dupla série de barras, sobre as quais havia papagaios de vários países. Eram vermelhos, azuis, verdes, cinzentos, amarelos e brancos; mas todos pareciam sofrer de saudades de sua terra. Ao fim da galeria encontrava-se uma pequena mesa defronte a uma lareira de estilo renascentista: àquela hora, o patrão tomava o desjejum… Após ter eu esperado um quarto de hora, dignou-se a aparecer… Bocejava, estava sonolento, parecia sempre a ponto de dormitar: andava como um sonâmbulo. Seu torpor tinha contaminado as paredes de seu hotel. Seus pensamentos assemelhavam-se a esses papagaios, como se tivessem se soltado e encarnado e ficados presos a um poleiro…”. ■ Intérieur ■ Rodenberg, Paris bei Sonnenschein und Lampenlicht, Leipzig, 1867, pp. 104-105.

[D 2, 6]

“Cada traje serve-se de alguns acessórios com os quais compõe uma bela figura, isto é, que custam muito dinheiro, pois se estragam facilmente, sobretudo porque qualquer gota de chuva os deteriora.” Isto a propósito da cartola. ■ Moda ■ F Th. Vischer, “Vernünftige Gedanken über die jetzige Mode”, em Kritische Gänge, Nova Série, 3º caderno, Stuttgart, 1861, p. 124.

[D 2a, 1]

II o flâneur e a massa

O tédio é um tecido cinzento e quente, forrado por dentro com a seda das cores mais variadas e vibrantes. Nele nós nos enrolamos quando sonhamos. Estamos então em casa nos arabescos de seu forro. Porém, sob essa coberta, o homem que dorme parece cinzento e entediado. E quando então desperta e quer relatar o que sonhou, na maioria das vezes ele nada comunica além desse tédio. Pois quem conseguiria com um só gesto virar o forro do tempo do avesso? E, todavia, relatar sonhos nada mais é do que isso. E não podemos falar das passagens de outro modo. São arquiteturas nas quais revivemos em sonhos a vida de nossos pais, avós, tal qual o embrião dentro do ventre da mãe revive a vida dos animais. A existência nesses espaços decorre sem ênfase, como nos sonhos. O flanar é o ritmo desta sonolência. Em 1839, Paris foi invadida pela moda das tartarugas. É possível imaginar muito bem como as pessoas elegantes imitavam nas passagens, mais facilmente ainda que nos boulevards, o ritmo destas criaturas. ■ Flâneur

[D 2a, 8]

Tédio nas cenas de cerimônia representadas nos quadros históricos e o dolce far niente dos quadros de batalhas, com tudo o que reside na fumaça de pólvora. Das imagens de Épinal até a Execução do Imperador Maximiliano do México, de Manet, encontra-se a sempre igual e sempre nova miragem, sempre o vapor no qual surge o Mogreby <?> ou o gênio da garrafa diante dos olhos sonhadores e distraídos dos amantes da arte. ■ Morada de sonho, museus

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[D 3, 1]

“Em resumo, a arte clássica urbana, depois de ter apresentado suas obras-primas, esterilizou- se no tempo dos filósofos e dos fabricantes de sistemas. O século XVIII, que terminava, havia trazido à luz inúmeros projetos; a Comissão dos Artistas os reunira em corpo de doutrina, o Império os aplicava sem originalidade criadora. Ao estilo clássico, flexível e vivo, sucedia o pseudoclássico, sistemático e rígido… O Arco do Triunfo repete a porta Louis XIV, a coluna Vendôme é imitação de Roma, a Madeleine, a Bolsa de Valores e o Palais-Bourbon são templos antigos.” Lucien Dubech e Pierre d’Espezel, Histoire de Paris, Paris, 1926, p. 345. ■ Intérieur

[D 3a, 2]

Máximas da pintura do Império: “Os artistas novos só admitiam o ‘estilo heróico, o sublime’, e o sublime só podia ser alcançado com ‘o nu e o drapeado’… Os pintores deviam procurar suas inspirações em Plutarco ou Homero, em Tito Lívio ou Virgilio, e escolher, de preferência, segundo a recomendação de David a Gros…, ‘temas conhecidos de todos’… Os temas tirados da vida contemporânea eram, por causa do estilo dos trajes, indignos da grande arte’.” A. Malet e P. Grillet, XIX Siècle, Paris, 1919, p. 158. ■ Moda

[O 1a, 3]

-II- prostituta

Sobre o mofo (Veuillot: “Paris cheira a mofo”) da moda: o “glauco clarão” sob as saias, de que fala Aragon. O espartilho como passagem do tronco. O imenso contraste com o mundo ao ar livre de hoje em dia. Aquilo que hoje é comum nas prostitutas baratas — não se despir — pode ter sido outrora a praxe mais distinta. Apreciava-se o retroussée — a saia levantada — na mulher. Hessel supõe ter encontrado aqui a origem do erotismo de Wedekind, cujo páthos do ar livre teria sido um blefe. E que mais? ■ Moda

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[O 2, 2]

Ainda sobre o fanatismo pelas máscaras: “Pelas estatísticas da prostituição sabe-se que a mulher perdida tem um certo orgulho pelo fato de a natureza considerá-la ainda digna de ser mãe. Este desejo, porém, não a impede de ter aversão aos incômodos e a deformação ligados a esta honraria. Por isso, ela escolhe de bom-grado um caminho intermediário para exibir o seu estado: ela o mantém ‘por dois meses, por três meses’, mas, naturalmente, não por mais tempo.” F. Th. Vischer, Mode und Cynismus, Stuttgart, 1879, p. 7. ■ Moda

[O 2a, 1]

Ritos de passagem – assim se denominam no folclore as cerimônias ligadas à morte, ao nascimento, ao casamento, à puberdade, etc. Na vida moderna, estas transições tornaram-se cada vez mais irreconhecíveis e difíceis de vivenciar. Tornamo-nos muito pobres em experiências liminares. O adormecer talvez seja a única delas que nos restou. (E, com isso, também o despertar.) E, finalmente, tal qual as variações das figuras do sonho, oscilam também em torno de limiares os altos e baixos da conversação e as mudanças sexuais do amor. “Como agrada ao homem”, diz Aragon, “manter-se na soleira da imaginação!” (Paysan de Paris, 1926, p. 74). Não é apenas dos limiares destas portas fantásticas, mas dos limiares em geral que os amantes, os amigos, adoram sugar as forças. As prostitutas, porém, amam os limiares das portas do sonho. – O limiar [Schwelle] deve ser rigorosamente diferenciado da fronteira [Grenze]. O limiar é uma zona. Mudança, transição, fluxo estão contidos na palavra schwellen (inchar, intumescer), e a etimologia não deve negligenciar estes significados. Por outro lado, é necessário determinar o contexto tectônico e cerimonial imediato que deu à palavra o seu significado. ■ Morada de sonho

[O 6a, 2]

II o flâneur e a massa

“À primeira vista somos levados a crer que existe um grande número de mulheres públicas, por uma espécie da fantasmagoria que produzem as idas e vindas dessas mulheres, sempre nos mesmos pontos, o que parece multiplicá-las ao infinito… Há uma outra circunstância que contribui para essa ilusão: os vários tipos de roupa com as quais se disfarçam as mulheres públicas numa mesma noite. Mesmo com um olho pouco exercitado, é fácil convencer-se de que uma moça que, às oito horas, está com uma roupa elegante, rica, é a mesma que aparece às nove como costureirinha, e que se mostra às dez como camponesa, e vice-versa. É assim em todos os pontos da capital onde afluem habitualmente as prostitutas. A título de exemplo, siga uma dessas moças no boulevard, entre as portas Saint-Martin e Saint-Denis: ela está agora com um chapéu de plumas e um vestido de seda coberto com um xale; ela entra na Rue Saint-Martin, segue pelo lado direito, passa pelas pequenas ruas que chegam à Rue Saint-Denis, entra em uma das inúmeras casas de devassidão que ali se encontram, e, pouco depois, sai vestida de costureirinha ou de camponesa.” F. F. A. Béraud, Les Filles Publiques de Paris, vol. I, Paris-Leipzig, 1839, pp. 51-52. ■ Moda

[S 1, 2]

III novidade

“Aconteceu-me várias vezes apreender certos fatos menores que se passavam diante de meus olhos e perceber neles uma fisionomia original, na qual eu me comprazia em discernir o espirito da época. ‘Isto’, eu dizia a mim mesmo, ‘só poderia se dar hoje, não poderia ser em outro momento. Isto é um sinal do tempo.’ Ora, reencontrei nove vezes em dez o mesmo fato em circunstâncias análogas em velhos relatos ou em velhas histórias.” Anatole France, Le Jardin d’Épicure, Paris, p. 113. ■ Moda

[S 1, 4]

Definição do “moderno” como o novo no contexto do que sempre existiu. A paisagem da charneca em Kafka (O Processo), sempre nova e sempre igual, não é um mau exemplo deste estado de coisas. “‘O senhor não gostaria de ver mais um quadro que eu poderia lhe vender?’… O pintor tirou de baixo da cama um monte de quadros sem moldura, tão cobertos de poeira que, quando o pintor tentou soprá-la da superfície do primeiro quadro, formou-se uma nuvem que ficou por um longo tempo diante dos olhos de K., sufocando-o. ‘Uma paisagem da charneca’, disse o pintor, oferecendo o quadro a K. Ele representava duas árvores mirradas, distantes uma da outra, sobre a grama escura. Ao fundo, um crepúsculo multicolorido. ‘Bom’, disse K., ‘eu o compro’. K. se expressara de modo tão conciso inadvertidamente, por isso ficou aliviado quando o pintor, em vez de levá-lo a mal, apanhou um segundo quadro do chão. ‘Aqui está o quadro complementar’, disse o pintor. Talvez ele pretendesse que assim o fosse, mas não se percebia diferença alguma em relação ao primeiro, estavam ali as árvores, aqui a grama e lá o crepúsculo. Mas K. não se incomodou. ‘São belas paisagens’, disse, ‘vou comprar ambos e pendurá-los em meu escritório’. ‘O tema parece lhe agradar’, disse o pintor, e pegou um terceiro quadro, ‘é uma sorte que eu tenha ainda um quadro parecido aqui’. Não era parecido, era exatamente a mesma paisagem da charneca, absolutamente igual. O pintor aproveitou bem esta oportunidade para vender quadros velhos. ‘Vou levar este também’, disse K. ‘Quanto custam os três quadros?’ Falaremos sobre isso em seguida, disse o pintor… ‘Aliás, fico contente que os quadros lhe agradem, eu lhe darei todos os quadros que tenho aqui embaixo. Todos eles representam paisagens da charneca, já pintei muitas delas. Algumas pessoas os rejeitam porque são sombrios demais; outras, porém, e o senhor é uma delas, apreciam justamente coisas sombrias’.” Franz Kafka, Der Prozeß, Berlim, 1925, pp. 284-286. ■ Haxixe

[S 2, 1]

O coletivo que sonha ignora a história. Para ele, os acontecimentos se desenrolam segundo um curso sempre idêntico e sempre novo. Com efeito, a sensação do mais novo, do mais moderno, é tanto uma forma onírica dos acontecimentos quanto o eterno retorno do sempre igual. A percepção do espaço que corresponde a esta percepção do tempo é a transparência da interpenetração e superposição do mundo do flâneur. Estas sensações de espaço e de tempo foram o berço para a escrita folhetinesca moderna. ■ Coletivo onírico

[S 2, 5]

III jugendstil

“Talvez nenhum simulacro tenha criado um conjunto de objetos aos quais se aplique com maior propriedade o conceito de ideal que o grande simulacro constituído pela perturbadora arquitetura ornamental do Modern Style. Nenhum esforço coletivo chegou a criar um mundo de sonho tão puro e tão inquietante quanto esses edifícios modern style, os quais, à margem da arquitetura, constituem por si mesmos verdadeiras realizações de desejos solidificados, nos quais o mais violento e cruel automatismo revela dolorosamente o ódio da realidade e a necessidade de refúgio num mundo ideal, à maneira do que se passa numa neurose infantil.” Salvador Dalí, “L’âne pourri”, in: Le Surréalisme au Service de la Révolution, ano I, n° 1, Paris, 1930, p. 12. ■ IndústriaReclame ■

[S 2a, 2]

III novidade

>Wiesengrund cita e comenta uma passagem de A Repetição, de Kierkegaard: “Sobe-se ao primeiro andar de uma casa iluminada a gás, abre-se uma pequena porta e eis a entrada. À esquerda, tem-se uma porta de vidro que conduz a um gabinete. Segue-se em frente e chega-se a uma ante-sala. Depois dela, dois quartos de igual tamanho, de mobília como se um dos quartos estivesse sendo refletido no espelho.” A propósito desta passagem — Kierkegaard, Gesammelte Werke, vol. III <Furcht und Zittern, Wiederholung [Temor e tremor, A repetição]>, Iena, 1909, p. 138 — que continua a citar, Wiesengrund comenta: “A duplicação do quarto que aparece refletido, sem de fato estar refletido, tem algo de insondável: assim como estes quartos, talvez toda aparência na história seja igual a si mesma, enquanto ela própria, escrava da natureza, persistir na aparência.” Wiesengrund-Adorno. Kierkegaard, Tübingen, 1933, p. 50. ■ EspelhoIntérieur

[K 1a, 2]

O fato de termos sido crianças nesta época faz parte de sua imagem objetiva. Ela tinha que ser assim para fazer nascer esta geração. Quer dizer: no contexto onírico procuramos um momento teleológico. Este momento é a espera. O sonho espera secretamente pelo despertar, o homem que dorme entrega-se à morte apenas até nova ordem — ele espera com astúcia pelo segundo em que escapará de suas garras. Assim também o coletivo que sonha, para o qual os filhos se tornam o feliz motivo para seu próprio despertar. ■ Método

[K 1a, 3]

Tarefa da infância: integrar o novo mundo ao espaço simbólico. A criança é capaz de fazer algo que o adulto não consegue: rememorar o novo. Para nós, as locomotivas já possuem um caráter simbólico, uma vez que as encontramos na infância. Nossas crianças, por sua vez, perceberão o caráter simbólico dos automóveis, dos quais nós vemos apenas o lado novo, elegante, moderno, atrevido. Não existe antítese mais rasa, mais estéril do que aquela que pensadores reacionários como Klages esforçam-se para estabelecer entre o espaço simbólico da natureza e a técnica. A cada formação verdadeiramente nova da natureza — e no fundo também a técnica é uma delas — correspondem novas “imagens”. Cada infância descobre estas novas imagens para incorporá-las ao patrimônio de imagens da humanidade. ■ Método

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[K 2, 3]

I recepção-III- salvação

Diz-se que o método dialético consiste em levar em conta, a cada momento, a respectiva situação histórica concreta de seu objeto. Mas isto não basta. Pois, para esse método, igualmente importante levar em conta a situação concreta e histórica do interesse por seu objeto. Esta situação sempre se funda no fato de o próprio interesse já se encontrar pré-formado naquele objeto e, sobretudo, no fato de ele concretizar o objeto em si, sentindo-o elevado de seu ser anterior para a concretude superior do ser agora (do ser desperto!). A questão de como este ser agora (que é algo diverso do ser agora do “tempo do agora”, já que é um ser agora descontinuo, intermitente) já significa em si uma concretude superior, entretanto, não pode ser apreendida pelo método dialético no âmbito da ideologia do progresso, mas apenas numa visão da história que ultrapasse tal ideologia em todos os aspectos. Aí deveria se falar de uma crescente condensação (integração) da realidade, na qual tudo o que é passado (em seu tempo) pode adquirir um grau mais alto de atualidade do que no próprio momento de sua existência. O passado adquire o caráter de uma atualidade superior graças à imagem como a qual e através da qual é compreendido. Esta perscrutação dialética e a presentificação das circunstâncias do passado são a prova da verdade da ação presente. Ou seja: ela acende o pavio do material explosivo que se situa no ocorrido (cuja figura autêntica é a moda). Abordar desta maneira o ocorrido significa estudá-lo não como se fez até agora, de maneira histórica, mas de maneira política, com categorias políticas. ■ Moda

[K 2, 6]

O Jugendstil — uma primeira tentativa de confrontação com o ar livre. Ele encontra uma primeira expressão característica, por exemplo, nos desenhos da revista Simplizissimus, que mostram claramente como era preciso recorrer à sátira para se conseguir respirar. Por outro lado, o Jugendstil pôde se desenvolver naquela luminosidade e naquele isolamento artificiais nos quais o reclame apresenta seus objetos. Este nascimento do “ar livre” a partir do espírito do intérieur é a expressão sensível da situação do Jugendstil do ponto de vista da filosofia da história: ele significa sonhar que despertamos. ■ Reclame