[D 10a, 4]

A essência do acontecimento mítico é o retorno. Nele está inscrita, como figura secreta, a inutilidade gravada na testa de alguns heróis dos infernos (Tântalo, Sísifo ou as Danaides). Retomando o pensamento do eterno retorno no século XIX, Nietzsche assume o papel daquele em quem se consuma de novo a fatalidade mítica. (A eternidade das penas infernais talvez tenha privado a idéia antiga do eterno retorno de sua ponta mais terrível. A eternidade de um ciclo sideral é substituída pela eternidade dos sofrimentos.)

[D 10a, 5]

A crença no progresso, em sua infinita perfectibilidade — uma tarefa infinita da moral —, e a representação do eterno retorno são complementares. São as antinomias indissolúveis a partir das quais deve ser desenvolvido o conceito dialético do tempo histórico. Diante disso, a idéia do eterno retorno aparece como o “racionalismo raso”, que a crença no progresso tem a má fama de representar, sendo que esta crença pertence à maneira de pensar mítica tanto quanto a representação do eterno retorno.