[K 3a, 1]

Sobre o significado político do filme. O socialismo jamais teria surgido no mundo se tivesse pretendido despertar o entusiasmo do operariado simplesmente por uma melhor ordem das coisas. O que constituiu a força e a autoridade do movimento foi o fato de Marx ter conseguido despertar o interesse dos operários por uma ordem na qual as condições de vida deles seriam melhores, mostrando que esta seria também uma ordem justa. Exatamente o mesmo vale para a arte. Em nenhuma época, por mais utópica que seja, será possível conquistar as massas para uma arte superior, mas apenas para uma arte que lhes seja mais próxima. E a dificuldade consiste justamente em dar a esta arte uma forma tal que se possa afirmar, em plena consciência, que se trata de uma arte superior. Ora, algo desse gênero dificilmente será alcançado por aquilo que é propagado pela vanguarda burguesa. Neste ponto, é perfeitamente correta a argumentação de Berl: “A confusão da palavra revolução, que significa para um leninista a conquista do poder pelo proletariado, e para outros a reviravolta dos valores espirituais estabelecidos, é acentuada pelos surrealistas por seu desejo de mostrar Picasso como um revolucionário… Picasso os decepciona … um pintor não mais revolucionário por ter ‘revolucionado’ a pintura que um costureiro como Poiret por ter ‘revolucionado’ a moda, ou algum médico por ter ‘revolucionado’ a medicina.” Emmanuel Berl, “Premier pamphlet” (Europe, no 75, 1929, p. 401). As massas decididamente exigem da obra de arte (que se situa, para elas, no domínio dos objetos de uso) algo que as aqueça. Aqui, a chama mais fácil para ser acesa é o ódio. O ardor do ódio, porém, fere ou queima, e não oferece o “conforto ao coração” que torna a arte própria para o consumo. O kitsch, ao contrário, nada mais é do que a arte em seu pleno, absoluto e instantâneo caráter de consumo. Assim, o kitsch e a arte, justamente em suas formas de expressão consagradas, se situam em uma oposição irreconciliável. Ora, o que importa para as formas vivas e em desenvolvimento é que tenham em si algo que aqueça, que seja utilizável, enfim, algo que traga felicidade, para que possam abrigar em si, dialeticamente, o kitsch, aproximando-se assim das massas e conseguindo, todavia, superá-lo. Atualmente, talvez apenas o cinema esteja à altura desta tarefa — de qualquer modo, é ele que se encontra mais próximo dela que qualquer outra forma de arte. E quem reconhecer isto estará inclinado a rebater as pretensões do filme abstrato, por mais importantes que sejam seus experimentos. Ele solicitará um período de resguardo, uma proteção natural para aquele kitsch que encontra no cinema seu lugar providencial. Somente o cinema pode detonar as substâncias explosivas que o século XIX acumulou nesta matéria estranha, talvez desconhecida anteriormente, que é o kitsch. Mas, assim como para a estrutura política do filme, a abstração pode também se tornar perigosa para os outros meios modernos de expressão (iluminação, técnica de construção etc.).

[K 3a, 2]

O problema formal da nova arte pode ser expressado exatamente desta maneira: quando e como os universos de formas que, sem a nossa interferência, surgiram na mecânica, no cinema, na construção de máquinas, na nova física etc., e que nos subjugaram, revelarão o que, neles, pertence à natureza? Quando será atingido o estado da sociedade em que essas formas, ou as que delas surgiram, revelar-se-ão para nós como formas naturais? De fato, isso evidencia apenas um momento na essência dialética da técnica. (É difícil dizer qual momento: a antítese, se não for a síntese.) De qualquer modo, também está presente na técnica um outro momento: o cumprimento de objetivos estranhos à natureza com meios que lhe são também estranhos e hostis, meios que se emancipam da natureza e a submetem.