[O 13, 1]

O supersticioso prestará atenção a sinais, o jogador reagirá a eles antes mesmo de poder percebê-los. Ter previsto um lance de sorte, mas não tê-lo aproveitado, é um fato do qual o novato concluirá que “está em boa forma”, e que da próxima vez apenas terá que agir com maior coragem e maior rapidez. Na realidade, porém, este acontecimento é um sinal de que o reflexo motor que o acaso provoca no jogador afortunado não chegou a ser ativado. Somente quando este reflexo não é ativado, é que entra nitidamente na consciência “aquilo que está por vir”.

[O 13, 3]

A proscrição do jogo tem provavelmente sua razão mais profunda no fato de que um dom natural do ser humano que o eleva acima de si mesmo, quando voltado para objetos mais elevados, é voltado para um dos objetos mais vis, o dinheiro, rebaixando assim o homem. O dom de que se trata é a presença de espírito. Sua manifestação suprema é a leitura, que, em ambos os casos, é divinatória.

[O 13, 4]

O sentimento particular de felicidade do ganhador é caracterizado pelo fato de que dinheiro e bens, que costumam ser as coisas mais maciças e mais pesadas do mundo, chegam-lhe através do destino como um abraço feliz plenamente retribuído. Elas podem ser comparadas ao testemunho de amor de uma mulher plenamente satisfeita pelo homem. Jogadores são tipos aos quais não é dado satisfazer a mulher. Não seria Don Juan um jogador?

[O 13, 5]

“No tempo do otimismo fácil que se expandia pela pena de um Alfred Capus, era costume no boulevard atribuir tudo à sorte.” Gaston Rageot, “Qu’est-ce qu’un événement?” [O que é um acontecimento] (Le Temps, 16 abr. 1939). — A aposta é uma forma de atribuir aos acontecimentos um caráter de choque, de destacá-los dos contextos da experiência. Não por acaso que se aposta nos resultados de eleições, na eclosão da guerra etc. Para a burguesia, em particular, os acontecimentos políticos assumem facilmente a forma de partidas realizadas na mesa de jogo. Esse não é bem o caso para o proletário. Ele está mais predisposto a reconhecer as constantes no acontecimento político.

[O 13a, 1]

O cemitério Des Innocents como zona de meretrício: “Este lugar foi … para os parisienses do século XV uma espécie de melancólico Palais-Royal de 1789. Em meio aos contínuos sepultamentos e exumações, existia ali um passeio público que era ponto de encontro. Havia pequenas lojas junto aos ossários, e mulheres fáceis sob as arcadas.” J. Huizinga. Herbst des Mittelalters, Munique, 1928, p. 210.

[O 13a, 4]

A máxima de Gracián — “Saiba, em todas as coisas, ter o tempo a seu lado” — não será compreendida melhor e com maior gratidão por ninguém do que por aquele que teve satisfeito um desejo acalentado por longo tempo. Compara-se a isto a magnífica definição dada a este tempo por Joubert. Ela determina o tempo do jogador per contrarium: “Há tempo até mesmo na eternidade, mas não é um tempo terrestre e mundano… Ele não destrói nada, ele completa.” J. Joubert, Pensées, vol. II, Paris, 1883, p. 162.

[O 13a, 5]

Sobre o elemento heróico no jogo, algo como um corolário para “Le jeu”, de Baudelaire: “Uma consideração que costumo fazer nas mesas de jogo…: Se acumulássemos toda a força e a paixão, desperdiçadas a cada ano nas mesas de jogo da Europa – seria isto suficiente para formar um povo romano e uma história romana? Mas é justamente isto! Como todo homem nasce como um romano, a sociedade burguesa procura desromanizá-lo, e por isso foram introduzidos os jogos de azar e de salão, os romances, as óperas italianas e os jornais elegantes, os cassinos, as rodas de chá e as loterias, os anos de aprendizagem e de andanças, os desfiles de guarnições e as trocas de guarda, as cerimônias e as recepções, e as quinze ou vinte bem ajustadas peças de vestuário que temos que vestir e despir diariamente com salutar perda de tempo – tudo isto para que a força supérflua possa se esvair imperceptivelmente!” Ludwig Börne, Gesammelte Schriften, vol. III, Hamburgo-Frankfurt a. M., 1862, pp. 38-39 (“Das Gastmahl der Spieler” – “O banquete dos jogadores”).

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