“Tentar a sorte não é uma volúpia medíocre. Experimentar — num segundo — meses, anos, toda uma vida de temor e de esperança não é um prazer sem embriaguez. Eu não tinha nem dez anos quando o Sr. Grépinet, meu professor da nona série, leu-nos em aula a fábula do Homem e do Gênio. No entanto, lembro-me dela melhor do que se a tivesse ouvido ontem. Um gênio dá a um menino um novelo de linha e lhe diz: ‘Este é o fio dos seus dias. Pega-o. Quando quiseres que seu tempo passe, puxa o fio: seus dias passarão rápidos ou lentos conforme você desenrolar o novelo, rápida ou lentamente. Enquanto você não tocar o fio, permanecerá na mesma hora da sua existência.’ O menino pegou o fio; puxou-o primeiro para tornar-se um homem, depois para desposar a noiva que amava, depois para ver crescerem seus filhos, para conseguir os empregos, os salários, as honras, para superar as preocupações, evitar os aborrecimentos, as doenças que vêm com a idade, enfim, ai de mim! para terminar uma velhice insuportável. Ele tinha vivido quatro meses e seis dias desde a visita do gênio. Pois bem! O que é o jogo senão a arte de viver num segundo as mudanças que o destino geralmente só produz ao longo de muitas horas e mesmo de muitos anos; a arte de acumular num só instante as emoções esparsas na lenta existência dos outros homens, o segredo de viver toda uma vida em alguns minutos, enfim, o novelo de linha do gênio? O jogo é um corpo-a-corpo com o destino… Joga-se a dinheiro — dinheiro, quer dizer, a possibilidade imediata, infinita. Talvez a carta que se vira ou a bolinha que corre dê ao jogador parques e jardins, campos e vastos bosques, castelos elevando ao céu suas torres pontiagudas. Sim, esta pequena bola que rola contém em si hectares de boa terra e telhados de ardósia, cujas chaminés esculpidas se refletem no Loire; ela encerra os tesouros da arte, as maravilhas do gosto, jóias prodigiosas, os corpos mais belos do mundo, e mesmo almas — que se pensava que não fossem venais —, todas as decorações, todas as honras, toda a graça e todo o poder da Terra… E você quer que não se jogue? Se pelo menos o jogo desse apenas esperanças infinitas, se mostrasse apenas o sorriso de seus olhos verdes, talvez não o amássemos tão ardorosamente. Mas ele tem unhas de diamante, é terrível; proporciona, quando lhe apraz, a miséria e a vergonha; é por isso que o adoramos. A atração do perigo subjaz a todas as grandes paixões. Não há volúpia sem vertigem. O prazer misturado com o medo embriaga. E o que há de mais terrível que o jogo? Ele dá e tira; suas razões não são absolutamente as nossas razões. Ele é mudo, cego e surdo. Pode tudo. É um deus… Tem seus devotos e seus santos que o amam pelo que ele é, não pelo que promete, e que o adoram quando os atinge. Se os despoja cruelmente, atribuem a falta a si mesmos, não a ele: ‘Joguei mal’, dizem. Eles se acusam e não blasfemam.” Anatole France, Le jardin d’Épicure, Paris, pp. 15-18.