E o tédio é a treliça diante da qual a cortesã provoca a morte. ■ Ennui ■
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arquivo temático B, folio 1
[B 1, 2]
Semelhança das passagens com os galpões cobertos onde se aprendia a pedalar. Nesses locais, a mulher assumia sua aparência mais sedutora: a de ciclista. Assim ela aparece nos cartazes da época. Chéret, o pintor dessa beleza feminina. A roupa da ciclista, como protótipo precoce e inconsciente da roupa esportiva, corresponde aos protótipos das formas oníricas, tal qual elas, um pouco antes ou depois, apareceram para as fábricas ou para o automóvel. Assim como as primeiras construções de fábricas apegavam-se à forma tradicional das moradias e as primeiras carrocerias de automóveis imitavam as carroças, também a expressão esportiva na roupa da ciclista luta ainda com a tradicional imagem ideal da elegância e o fruto desta luta é o toque obstinado, sádico, que tornou estes anos tão incomparavelmente provocantes para o mundo masculino. ■ Moradas de sonho ■
[B 1, 3]
“Nestes anos [por volta de 1880], começa não só a moda do Renascimento a fazer traquinagens, mas também se inicia, por outro lado, um prazer novo da mulher pelo esporte, principalmente pela equitação, e ambas as coisas influenciam a moda em direções bastante diferentes. É original, embora nem sempre bonita, a maneira como os anos de 1882 a 1885 procuram conciliar os sentimentos que fazem a alma feminina oscilar de um lado para o outro. Busca-se uma solução ao modelar a cintura da maneira mais justa e simples, tornando, porém, a saia ainda mais rococó.” 70 Jahre deutsche Mode, 1925, pp. 84-87.
[B 1, 4]
Aqui a moda inaugurou o entreposto dialético entre a mulher e a mercadoria — entre o desejo e o cadáver. Seu espigado e atrevido caixeiro, a morte, mede o século em braças e, por economia, ele mesmo faz o papel de manequim e gerencia pessoalmente a liquidação que, em francês, se chama révolution. Pois a moda nunca foi outra coisa senão a paródia do cadáver colorido, provocação da morte pela mulher, amargo diálogo sussurrado com a putrefação entre gargalhadas estridentes e falsas. Isso é a moda. Por isso ela muda tão rapidamente; faz cócegas na morte e já é outra, uma nova, quando a morte a procura com os olhos para bater nela. Durante um século, a moda nada ficou devendo à morte. Agora, finalmente, ela está prestes a abandonar a arena. A morte, porém, doa a armadura das prostitutas como troféu à margem de um novo Letes que rola pelas passagens como um rio de asfalto. ■ Revolução ■ Amor ■
[B 1, 5]
[B 1, 6]
“Nada está inteiramente em seu lugar, mas é a moda que fixa o lugar de tudo.” L’Esprit d’Alphonse Karr, Paris, 1877, p. 129. “Se uma mulher de bom gosto, ao desnudar-se à noite, se encontrasse realmente do jeito que insinuou ser durante o dia todo, creio que seria encontrada, no dia seguinte, submersa e afogada em suas lágrimas.” Alphonse Karr, cit. em E Th. Vischer, Mode und Zinismus, Stuttgart, 1879, pp. 106-107.
[B 1, 7]
Em Karr, encontra-se uma teoria racionalista da moda, que apresenta muita semelhança com a teoria racionalista da origem das religiões. Ele atribui o aparecimento de saias longas ao fato de certas mulheres terem interesse em esconder um <pé> sem graça. Ou ele denuncia como origem de cenas formas de chapéus e penteados o desejo de disfarçar um cabelo ralo.
[B 1, 8]
Quem hoje ainda se lembra onde, na última década do século passado, as mulheres ostentavam aos homens sua aparência mais sedutora, a mais íntima promessa de seu corpo? Nos galpões cobertos e asfaltados nos quais se aprendia a pedalar. Como ciclista, a mulher disputa o primeiro lugar com a cantora dos cartazes e dá à moda sua linha mais ousada.
[B 1a, 1]
Para o filósofo, o aspecto mais interessante da moda é sua extraordinária capacidade de antecipação. É consenso que a arte, muitas vezes, geralmente por meio de imagens, antecipa em anos a realidade perceptível. Ruas ou salas puderam ser vistas em suas variadas cores brilhantes bem antes que a técnica, através de anúncios luminosos ou outros dispositivos, as colocasse sob uma luz desse tipo. Da mesma forma, a sensibilidade individual de um artista em relação ao futuro ultrapassa em muito aquela da dama da sociedade. E, entretanto, a moda está em contato muito mais constante, muito mais preciso, com as coisas vindouras graças ao fato incomparável que o coletivo feminino possui para o que nos reserva o futuro. Cada estação da moda traz em suas mais novas criações alguns sinais secretos das coisas vindouras. Quem os soubesse ler, saberia antecipadamente não só quais seriam as novas tendências da arte, mas também a respeito de novas legislações, guerras e revoluções. — Aqui, sem dúvida, reside o maior encanto da moda, mas também a dificuldade de torná-lo frutífero.
[B 1a, 2]
“Pode-se traduzir contos populares russos, sagas familiares suecas e histórias de malandros inglesas e encontraremos sempre a França naquilo que dá o tom à massa, não porque isso será sempre a verdade e, sim, porque isso sempre será moda.” Gutzkow, Briefe aus Paris, Paris, vol. II, Leipzig, 1842, pp. 227-228. Mas o que dá o tom é sempre o que é mais novo, mas apenas onde este emerge entre as coisas mais antigas, mais passadas, mais habituais. Este espetáculo — como o que é totalmente novo se forma a partir daquilo que se passou — é o verdadeiro espetáculo dialético da moda. Somente desta maneira, como apresentação grandiosa desta dialética, podem-se compreender os livros singulares de Grandville, que tiveram um tremendo sucesso na metade do século. Quando ele apresenta um novo leque como Leque de Íris, através do desenho de um arco-íris, quando a Via Láctea é apresentada como uma avenida noturna iluminada por candelabros a gás, quando A Lua Pintada por Ela Mesma repousa não sobre nuvens, mas sobre almofadas de pelúcia da última moda, só então se compreende que justamente neste século, o mais árido e menos imaginativo de todos, toda a energia onírica de uma sociedade se refugiou com dupla veemência no reino nebuloso, silencioso e impenetrável da moda, no qual o entendimento não a pode acompanhar. A moda é a precursora, não, é a eterna suplente do Surrealismo.
[B 1a, 3]
Duas gravuras lascivas de Charles Vernier representam, como contrapartida, “um casamento em velocípede” — ida e volta. A roda oferecia uma possibilidade inimaginada para a representação da saia levantada.
[B 1a, 4]
Uma perspectiva definitiva sobre a moda oferece-se apenas pela observação de como para cada geração aquela que a precedeu imediatamente parece ser o antiafrodisíaco mais radical que se possa conceber. Com este julgamento, ela não está tão errada como se pode imaginar. Há em cada moda algo de sátira amarga do amor, cada moda contém todas as perversidades sexuais da maneira mais impiedosa possível, cada uma comporta em si resistências secretas contra o amor. Vale a pena confrontar-se com a seguinte observação de Grand-Carteret, não importa quão superficial ela seja: “É pelas cenas da vida amorosa que se percebe, na verdade, aparecer todo o ridículo de certas modas. Estes homens, estas mulheres, não são eles grotescos em gestos, em poses, pelo topete extravagante em si mesmo, pelo chapéu de copa alta, pelo redingote ajustado à cintura, pelo xale, pelos chapéus de abas largas, pelos pequenos borzeguins de tecido?” O confronto das gerações passadas com as modas tem então uma importância muito maior do que se imagina habitualmente. E é um dos aspectos mais importantes do costume histórico de empreender isso sobretudo no teatro. A partir do teatro, a questão do costume penetra profundamente na vida da arte e da poesia, nas quais a moda é, ao mesmo tempo, mantida e superada.