Assim como a técnica mostra a natureza em uma perspectiva sempre nova, assim também, no que toca ao homem, ela mobiliza de forma sempre variada seus mais primitivos afetos, angústias e imagens de desejo [Sehnsuchtsbilder]. Neste trabalho, quero conquistar para a história primeva uma parte do século XIX. A face atraente e ameaçadora da história primeva aparece claramente para nós nos primórdios da técnica, no estilo de morar do século XIX; naquilo que está temporalmente mais próximo de nós, essa face ainda não se revelou. Ela aparece mais intensamente na técnica — em razão da causa natural desta — do que em outros domínios. É por isso que fotografias antigas — diferentemente do que acontece com gravuras antigas — possuem algo de espectral.
[K 2a, –]
arquivo temático K, folio 2, pg 3
[K 2a, 2]
Sobre o quadro de Wiertz, Pensamentos e visões de um decapitado, e sua explicação. A primeira coisa que chama a atenção nesta experiência magnetopática é o salto magnífico que a consciência dá na morte. “Estranho! Aqui debaixo do cadafalso está a cabeça no chão, pensando que ainda está em cima, acredita que ainda faz parte do corpo, ainda está esperando o golpe que deve separá-la do tronco.” A. J. Wiertz, Œuvres Littéraires, Paris, 1870, p. 492. Trata-se, em Wiertz, da mesma inspiração que permitiu a Bierce criar a grandiosa narrativa do rebelde que é enforcado. No instante de sua morte, este rebelde vive a fuga que o liberta de seus carrascos.
[K 2a, 3]
Cada corrente de moda ou de visão do mundo tem seu declive determinado por aquilo que caiu no esquecimento. O declive é tão forte que normalmente só o grupo pode se entregar a ele; o indivíduo — o precursor — corre o risco de sucumbir sob a violência da correnteza, como ocorreu com Proust. Em outras palavras: o que Proust, enquanto indivíduo, viveu em termos de fenômeno da rememoração, nós somos obrigados a experimentar (em relação ao século XIX) como “corrente”, “moda”, “tendência” — como uma espécie de castigo pela indolência que nos impediu de assumirmos esta rememoração.
[K 2a, 4]
A moda, como a arquitetura, situa-se na penumbra do instante vivido, pertence à consciência onírica do coletivo. Este desperta, por exemplo, no reclame.
[K 2a, 5]
“Muito interessante…, observar como a influência do fascismo no domínio da ciência teve que modificar justamente aqueles elementos em Freud que provinham ainda do período iluminista e materialista da burguesia… Em Jung, … o inconsciente não é mais individual — não é, portanto, um estado adquirido no homem … isolado —, e sim um tesouro da humanidade primitiva, que volta a ser atual; tampouco seria um recalque, mas um bem-sucedido retorno.” Ernst Bloch, Erbschaft dieser Zeit, Zurique, 1935, p. 254.
[K 2a, 6]
Índice histórico da infância segundo Marx. Em sua dedução do caráter normativo da arte grega (como arte nascida da infância da espécie humana), Marx diz: “Cada época não vê reviver, na natureza da criança, seu próprio caráter em sua forma verdadeira e natural?” Cit. em Max Raphael, Proudhon, Marx, Picasso, Paris, 1933, p. 175.